sexta-feira, 13 de novembro de 2009

A fotografia conceitual de Julia Margaret Cameron

Danúbia Vilhena

A fotografia foi a grande descoberta de seu tempo pela sua capacidade de aprisionar o momento vivido com similaridade estática que os pintores jamais conseguiriam. Por causa da sua popularização houve necessidade de dividi-la segundo os ramos de atuação, atendendo a demanda da publicidade, antropologia, cinema, e outros.
Alguns autores a dividiram em dois grandes grupos, documental e conceitual, que se distiguem pela linguagem que cada um assume como técnica de trabalho. A foto documental usa da técnica fotográfica para passar uma mensagem direta, jornalística, denotativa. A linguagem da fotografia conceitual é simbólica, uma metáfora em imagem, utilizando-se da técnica fotográfica para passar diferentes mensagens, sentimentos e interpretações. Ela depende do artista que a projetou e geralmente nasce antes de imagem ser fotografada, mas a mensagem recebida precisa da interpretação do espectador que a observa, podendo ser ampla ou restrita conforme sua capacidade de leitura, pois a imagem conceitual é um código a ser revelado.
Dentre muitos fotógrafos que se utilizaram da imagem conceitual para descrever suas idéias e visão de mundo está Julia Margaret Cameron, fotografa indiana, cuja formação se deu na França, para onde mudou-se após o casamento, e por mestres da fotografia da qual era amiga. Julia foi a mãe do desfoque, muito criticada em sua época, só reconhecida como técnica fotográfica muito tempo depois.
A fotógrafa, apesar das críticas, dedicou-se ao aprimoramento do desfoque tornado-se mestra neste estilo. Sua obra mais reconhecida foi Beatrice, baseada na história da romana do século XVI, Beatrice Cenci, que viveu abusos de seu padrasto durante sua adolescência e, com a ajuda de sua mãe, contratou assassinos para matá-lo. Descoberto o crime, a jovem Beatrice foi enforcada, tornado pública a situação que vivia.
Em Beatrice de Cameron, percebemos uma foto totalmente defocada, na qual o ponto mais nítido seria o turbante. Analisando a sintaxe da imagem, percebemos de forma direta a imagem de uma mulher submissa a condição machista da sociedade. Isso é afirmado pelos cabelos compridos, trajes que lembram uma escrava, e turbante na cabeça, usados neste período durante os serviços domésticos.
Essa resignação é confirmada pelo fato da modelo não olhar diretamente para a câmera. Porém, como se trata de uma foto conceitual, precisamos ler as entrelinhas que a tornaram a principal obra de Cameron e as letras pequenas estão no desfoque, que pareceria um erro do fotografo, se essa não fosse uma obra da mestra neste estilo.
Por que, então, a mãe desta arte desfocou a foto quase que totalmente? Talvez ai esteja a grandiosidade de sua obra, porque a mensagem que Margaret quer passar é a verdadeira história de Beatrice, que nunca foi uma mulher submissa, mas enfrentou a sociedade para livrar-se da situação por ela vivida. É no desfoque que Cenci é revelada de forma subliminar, destorcendo a imagem de resignação e revelando a humanidade da pessoa retratada.
O detalhe do turbante, nesta visão, seria a mensagem mais dura da foto, pois Cameron fala da repressão que sofre todas as mulheres desta época que tentassem viver alheia as regras machistas, e que sofreu Beatrice, pois lembra uma corda enrolada, a corda da forca.
Fazendo a autópsia desta obra, percebemos que a foto conceitual, para Cameron, aparece como seu diário de bordo, sua voz, seu modo de expressão. Em Beatrice, uma idéia que não pode ser dita, em outras, o olhar sobre o cotidiano ou a admiração pela inteligência, como as fotos de seu amigo Charles Darwin onde o foco está na cabeça e nas barbas, símbolo de sabedoria.
As fotos de Margaret Cameron exemplificam muito bem o significado de conceitual, pois trata-se de cartas-códigos a serem lidas e interpretadas, mas que só seriam completamente compreendidas com o código nas mãos, e este código é a visão de Julia sobre o mundo.


Este texto é o resumo do trabalho apresentado à disciplina Semiótica, sob orientação do professor Ivan Carlo.

2 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns, Danúbia, pela pesquisa, pelo texto. Vá em frente!

Maria Angela

Anônimo disse...

Danúbia, soubemos de seu sucesso no Curso do SEBRAE/CETIQ.
Nós todos, professores e acadêmicos do Design, ficamos orgulhosos em tê-la no CEAP.

Maria Angela Paes Leme